Samuel unge Davi. Painel interior da Sinagoga de Dura Europos. Siria. Século III DC, via wikicommons |
Uma preliminar importante é o uso da Bíblia como fonte histórica. Como exposto aqui no adcummulus anteriormente vamos ouvir com frequência os termos maximalista e minimalista, que descrevem uma postura geral dos estudiosos quanto a confiabilidade histórica dos textos bíblicos. Como observa o Professor Airton José da Silva, "(...) controvérsia existente entre a postura maximalista que defende que tudo nas fontes que não pode ser provado como falso deve ser aceito como histórico e a postura minimalista que defende que tudo que não é corroborado por evidências contemporâneas aos eventos a serem reconstruídos deve ser descartado. [1]
Esclarecemos também, naquela ocasião, a opção "maximalista" ou "minimalista" não necessariamente reflete a visão religiosa ou teológica do pesquisador (existem ateus e agnósticos identificados com os"maximalistas", como o arqueólogo William Dever; assim como existem judeus praticantes e cristãos minimalistas), e que tais tais definições demarcam os extremos. A esmagadora maioria dos arqueólogos, historiadores e biblistas se posiciona entre um e outro polo, combinando diferentes proporções das duas posturas, formando um espectro. É comum uma abordagem basicamente minimalista para alguns períodos (como os patriarcas, êxodo e conquista) e maximalista para outros (monarquia unida e reinos de Israel e Judá), sendo o foco da discussão deslocado para definir a "fronteira" em que se vai adotar cada uma das posturas. Assim, uma visão típica do "centro" do espectro considera que a obra deuteronomista foi concluída no reinado do Rei Josias, no final do século VII AC, mas que incorpora material de crônicas reais e sacerdotais e tradições populares, que sofreram um profundo processo de reinterpretação teológica. Assim, o deuteronomista nos daria corretamente o "fluxo geral" e um esboço dos acontecimentos históricos.
A invasão de Sisaque, 925 AC
Relevo da campanha de Sisaque, via wikicommons
No quinto ano do reinado de Roboão, Sisaque, rei do Egito, atacou Jerusalém. Levou embora todos os tesouros do templo do Senhor e do palácio real, inclusive os escudos de ouro que Salomão havia feito. Por isso o rei Roboão mandou fazer escudos de bronze para substituí-los, e os entregou aos chefes da guarda da entrada do palácio real. 28 Sempre que o rei ia ao templo do Senhor, os guardas empunhavam os escudos, e, em seguida, os devolviam à sala da guarda. Os demais acontecimentos do reinado de Roboão, e tudo o que fez, estão escritos nos registros históricos dos reis de Judá. Houve guerra constante entre Roboão e Jeroboão. (I Reis 14:25-29).Sisaque foi faraó do Egito entre 943-922 AC, e fundou a 22ª dinastia. Por volta do ano 930 AC, Sisaque (Sesac ou Sheshonk) invadiu a Palestina e, usando as palavras do texto bíblico "tomou as cidades fortificadas de Judá e chegou até Jerusalém (II Cronicas. 12:4). A expedição vitoriosa de Sisaque foi inscrita em pedra em um portal no Templo de Ramsés II em Karnak.
Mario Liverani, Professor de História do Antigo Oriente Médio da Universidade de Roma La Sapienza, detalha os efeitos da invasão
"O período "formativo" dos reinos de Judá e de Israel se encerra com um evento traumático: a expedição do faraó Sheshonq através de toda a Palestina (c 925 AC). O evento é conhecido seja pela inscrição do faraó sobre o Templo de Karnak (cf ANET, p. 242-243, 263-264), com uma longa lista das localidades atravessadas e conquistadas ou eventualmente destruídas, seja pela breve notícia do livro de Reis (1 Reis 14:35-38;cf 2 Cr 12:1-12) sobre o tributo pago por Roboão de Judá. A campanha teria acontecido, portanto, depois da morte de Salomão, com os reinos de Judá e Israel já separados"[2]
Amihai Mazar, Professor de Arqueologia da Universidade Hebraica de Jerusalém, aborda os efeitos da invasão do ponto de vista arqueológico na região ao sul de Jerusalém:
A Estela de Mesha (Pedra Moabita), 847 AC
A Estela de Mesha ou Pedra Moabita é mantida no Museu do Louvre, em Paris, e foi descoberta em 1868, por Frederik Augustus Klein, em Dibon, atual Jordânia. O Reino de Moabe, junto com Amon e Edom, fazia fronteira com Israel e Judá. Quando Mesha assumiu o trono, Moabe era um reino vassalo de Israel. A estela é um relato de como ele reverteu esse estado de coisas com ajuda de Kemosh, deus de Moabe.
Conforme o relato bíblico, os Reis de Israel, Judá e Edom marcharam contra Mesha, e o cercaram em sua capital, Dibon. Contudo, ao verem o Rei sacrificar seu próprio filho para Kemosh, ficaram ultrajados e se retiraram.
Professor Kenneth Kitchen, compara a versão de Mesha com o relato bíblico:
Esses assentamentos na região montanhosa de Negueb foram provavelmente destruídos e abandonados como resultado da campanha militar do Faraó Sesac na região cinco anos após a morte de Salomão (...). A lista topográfica de Sesac, preservada nas paredes do templo de Amon em Karnak, inclui quase setenta nomes de lugares do Negueb. Alguns deles podem ser identificadas na área de Arad e Bersabéia, mas outros estavam talvez localizados mais ao sul, na região montanhosa do Negueb. O prefixo hgr aparece e é possivelmente uma transcrição egípcia do termo hebraico hagar, "cinturão' ou "recinto, que poderia ter designado as "fortalezas' de casamatas do Negueb. (...) [3]Mazar continua, agora seguindo o rastro da expedição do faraó no norte e centro de Israel.
Já registramos o avanço pelo sul da campanha no Negueb; as operações do norte e no centro tiveram lugar na região montanhosa, o coração do território israelita. Sesac cruzou o Sefelá via Vale de Aialon e ascendeu a Cariat-Iarim e gabaon, ameaçando assim Jerusalém a partir do nordeste. Roboão, rei de Judá, evitou que a capital sofresse um sítio egípcio pagando um pesado tributo "Apoderou-se dos tesouros do templo do Senhor e dos tesouros do palácio real; ele levou tudo, inclusive todos os escudos de ouro que Salomão mandara fazer" (I Reis 14:26). O recém-nascido Reino do Norte, Israel, sofreu consideravelmente; a incursão de Sesac espalhou-se em arco desde gabaon até Betel, passando pelo Vale do Jordão e chegando até o vale de Jezrael. Ele então varreu a rota costeira histórica ("o caminho do mar") de Meguido até Gaza. Algumas das maiores destruições desse período podem ser atribuídas à campanha de Sesac: Tamna (Tel Batash, estrato IV), Gazer (Estrato VIII), Tell el-Mazar, Tell el-Hama, Tell el Sa'idiyeh (estes três sítios no Vale do Jordão), Meguido (Estrato IVB-VA), Tell Abu Hawân )(Estrato III), Tel Mevorakh (Estrato VII), Tel Michal e Tell Qasile (Estrato VIII). Aparentemente, Meguido foi só em parte destruída - pois o portão de seis câmaras parece ter continuado em uso n período seguinte, e Sesac erigiu lá uma estela da vitória, da qual um fragmento foi achada nas escavações.[3]Liverani atribui um significado político mais amplo a ação de Sisaque. A idéia seria revitalizar as antigas reinvindicações egípcias de soberania na região, evocando o período a palestina era o quintal egípcio:
Se posto num mapa, o itinerário desenha uma espécie de grande S ao contrário, que evita tocar sistematicamente os territórios de Judá e de Israel, preferindo costea-los. O interesse parece se adensar sobre zonas planas (médio Jordão, planície de Yizre'el, planície costeira), zonas a qual o Egito se vangloriava de ter uma tradicional soberania, que se tornara agora teórica, mas que sheshonq procurava revitalizar com sua expedição. Se essa interpretação está correta, parece claro que os reinos de Judá e Israel estavam então não somente separados (ou já separados, como quer o texto bíblico, ou jamais unidos antes, como é também possível), mas ambos muito pequenos, em particular o reino de Israel estava ainda separado das tribos galiléias pela permanência do corredor "cananeu" na baia de Akko´ao médio Jordão.[4]Kenneth Kitchen, Professor de Egiptologia da Universade de Liverpool, observa que Sisaque não menciona explicitamente Jeroboão ou Roboão, bem como os reinos Judá e Israel, mas isso é usual neste tipo de inscrição [5]. (A Estela do Faraó Merneptah, de cerca de 1200 AC, declara que "Israel está destruído, e sua semente já não existe mais", atesta a presença de Israel, como um entre os vários povos (e cidades estado) na Palestina). Kitchen é da opinião que as fontes egípcias e hebraicas complementam-se mutuamente, apesar das profundas diferenças de composição.
A Estela de Mesha (Pedra Moabita), 847 AC
Mesha, rei de Moabe, tinha muitos rebanhos e pagava como tributo ao rei de Israel cem mil cordeiros e a lã de cem mil carneiros. Mas, depois que Acabe morreu, o rei de Moabe rebelou-se contra o rei de Israel. Então, naquela ocasião, o rei Jorão partiu de Samaria e mobilizou todo o Israel. Também enviou esta mensagem a Josafá, rei de Judá: “O rei de Moabe rebelou-se contra mim. Irás acompanhar-me na luta contra Moabe?” Ele respondeu: “Sim, eu irei. Serei teu aliado, os meus soldados e os teus, os meus cavalos e os teus serão um só exército”. E perguntou: “Por qual caminho atacaremos?” Respondeu Jorão: “Pelo deserto de Edom”. (II 3:4-8)
Estela de Mesha, Rei de Moabe, via wikicommons
A Estela de Mesha ou Pedra Moabita é mantida no Museu do Louvre, em Paris, e foi descoberta em 1868, por Frederik Augustus Klein, em Dibon, atual Jordânia. O Reino de Moabe, junto com Amon e Edom, fazia fronteira com Israel e Judá. Quando Mesha assumiu o trono, Moabe era um reino vassalo de Israel. A estela é um relato de como ele reverteu esse estado de coisas com ajuda de Kemosh, deus de Moabe.
Eu Mesha, filho de Kemosh [...], Rei de Moabe, o dibonita – o meu pai reinou sobre Moabe 30 anos e eu reinei depois do meu pai – fiz este lugar alto para Kemosh, Qarhoh, porque ele me salvou de todos os reis e me fez triunfar de todos os meus adversários. No que toca a Omri, Rei de Israel, este humilhou Moabe durante muito tempo, porque Kemosh estava irritado com sua terra. E o seu filho seguiu-o e disse também: Hei de humilhar Moabe. No meu tempo ele o disse, mas eu triunfei sobre ele e a sua casa, enquanto Israel tinha perecido para sempre! Omri tinha ocupado a terra de Mádaba e Israel tinha habitado lá no seu tempo e durante metade do tempo do seu filho, por 40 anos; mas Kemosh habitou ali, no meu tempo. Eu construi Baal Meon, e nela construi um tanque. Eu construi Kirjathan. Os gaditas tinham habitado na terra desde tempos antigos, e o rei de Israel tinha constrido para si Ataroth. Eu guerriei, porém, contra a cidade e a tomei.A inscrição nos informa que Moabe foi dominado pelo Reino de Israel do Norte, a partir do reinado de Omri, e que a situação perdurou sobre Acabe. Após a morte deste, Mesha se revoltou, e foi bem sucedido, recuperando os antigos territórios de Moab, e derrotando não só Israel, mas Edom, e Judá.
Conforme o relato bíblico, os Reis de Israel, Judá e Edom marcharam contra Mesha, e o cercaram em sua capital, Dibon. Contudo, ao verem o Rei sacrificar seu próprio filho para Kemosh, ficaram ultrajados e se retiraram.
Professor Kenneth Kitchen, compara a versão de Mesha com o relato bíblico:
Here there is overlap with the Hebrew account, but also additional information(just as in Shoshenq's case) Both accounts agree in portraying the basic situation; namely, that the Omride Dynasty in Israel had suceed in imposing its overlordship upon Moab, turning the Moabite Kingdom into a tribute-paying vassal, and that for a clear span of years, not just the odd year or two. That situation began under Omri and contnued under Ahab until his death. But under Joram, the Moabite King rejected vassal status and rebelled. (Tradução) Aqui há sobreposição com o relato hebraico, mas também informações adicionais (assim como no caso de Shoshenq) Ambos relatos concordam em retratar a situação básica; ou seja, que a Dinastia Omrida em Israel tinha imposto sua soberania sobre Moabe, transformando o Reino Moabita em um vassalo pagador de tributo, e isso por um período de muitos anos e não apenas em ano ou dois . Essa situação começou sob Omri e contida sob Acabe até a sua morte. Mas sob Jorão, o Rei de Moabe rejeitou o status vassalo e rebelou-se. [5]O movimento de Mesha deve ser analisado em um contexto mais amplo. Há indícios de mudanças profundas nas estruturas sociais e econômicas de Moabe, permitindo a Mesha acumular recursos para ser mais que um criador de rebanhos para os reis omridas. Mario Liverani aponta os resultados das escavações arqueológicas na região:
Houve um extraordinário desenvolvimento sóciopolítico pela metade do século IX, e a estela de Mesha (SSI I 16) fornece úteis indicações a ser integradas aos dados arqueológicos. Deve se presumir que durante a primeira metade do período do Ferro Moabe tenha tido uma estrutura tribal muito dispersa, que se coadunava bem com uma economia agropastoril praticada nas zonas mais favorecidas (...) Mas na epoca de Mesha completa-se um processo de unificação, induzido pelas necessidades de competir com os Estados mais fortes e organizados que tinham se formado a norte e a oeste. O fato é que o reino de Mesha se caracteriza pela unificação politica em torno da capital Dibon (...) a existência de capitais cantonais como Madaba, Atarot, Yahas, a construção de cidades fortificadas (...) [6].Em 1994, O Professor André Lemaire, professor da Ecole Pratique des Hautes Etudes, propos a leitura da linha 32 da Estela como se referindo a Casa de David. Desde então, sua proposta tem alcançado significativa aceitação pelos estudiosos, tais como Kenneth Kitchen e Israel Finkelstein [7][8]. Seria também a primeira menção extrabíblica a Dinastia de David.
Da mesma forma, a menção a Omri na estela de Mesha é uma das duas primeiras a reis israelitas em fontes extrabíblicas. Em 853 AC, Acabe, filho de Omri, é mencionado numa Estela de Salmaneser III, da Assíria, como um dos doze reis que teriam sido derrotados por ele na Batalha de Quarquar (os assírios reinvidicaram vitória, mas o embate foi provavelmente não conclusivo). Salmaneser relata que "Acabe, o Israelita" compareceu a batalha com um força considerável de 2 mil carruagens e 10 mil homens, representando um dos maiores exércitos da coalizão. Em conjunto, as inscrições evidenciam o grande poder da disnatia Omrida.
A Estela de Tel Dan, 840 AC
Estela de Tel Dan, Museu de Israel, via wikicommons |
Qualquer relação das maiores descobertas arqueológicas recentes, fará justiça a Estela de Tel Dan. Descoberta pelo Professor Avraham Abiram e sua equipe, em escavações no norte de Israel entre 1993 e 1994. A inscrição real é do século IX AC, e dela restaram três fragmentos. Embora o Rei que comissionou a estela não seja identificado, as informações constantes no artefato e contexto histórico apontam para Hazael, Rei da Síria.
(Quando) meu pai ficou doente e foi ao encontro dos seus (antepassados)o rei de Israel veio à terra de meu pai. Mas Hadad me fez rei, e Hadad veio até mim e eu parti dos sete [...] do meu reino e eu matei set[enta r]eis que tinham preparado mi[lhares de ca]rros e milhares de cavalos. [E eu matei Yeho]ram, filho [de Acabe], rei de israel e eu matei [ahaz]yahu, filho [de Yehoram r]ei da Casa de Davi. E eu levei [à ruína a cidade deles e] a terra deles á [ desolação].Mario Liverani descreve o contexto imediato da inscrição:
A inscrição se une intimamente à narrativa de 2 Reis 8:28-29 (que ajuda a integrar os nomes parcialmente danificados), mas traz elementos novos em relação ao texto bíblico, Vê-se claro que o rei autor da inscrição de Tel Dan é Haza'el, Rei de Damasco, que depois da vitoria pode ocupar a cidade de Dan por tempo suficiente para erigir sua estela celebrativa. E é claro que a revolta de Yehu contra Yoram/Yehoram fazia parte da ofensiva damascena , tanto que Haza'el se vangloria de ter morto ele próprio o rei de Israel e de Judá, que o livro dos Reis relata como mortos por Yehu. Yehu, posto no trono por vontade de Haza'el ou pelo menos por contragolpe da vitória de Haza'el, iniciou, portanto, o seu reino como vassalo do Rei de Damasco.[9]
A inscrição é também importante na avaliação da natureza das relações dos reinos de Israel e Judá com seus vizinhos. Anos antes, como descrito acima, uma coalização de estados médios, em que os sírios e o rei Acabe de Israel aparecem de forma proeminente, haviam conseguido se opor, e possivelmente conter, o poderoso Império Assírio. Agora, Israel e Siria estão se confrontando. Enquanto isso, os reis de Israel e de Judá estão novamente em aliança, como no conflito moabita.
Obelisco Negro de Salmaneser III, Jeú oferece tributo ao Rei da Assiria, Museu Britãnica, via wikicommons. |
A submissão ao Rei Assírio, contudo, parece não ter beneficiado Jeú tanto assim, pois II Reis 10:32-33 nos diz:
Naqueles dias , o Senhor começou a reduzir o tamanho de Israel. O Rei Hazael conquistou todo o território israelita a leste do Jordão, incluindo toda a terra de Gileade (II Reis 10:32-34).O livro de Reis atribui o fracasso final de Jeú ao fato de não ter "obedecido de todo o coração a lei do Senhor, Deus de Israel, nem se afastou dos pecados que Jeroboão levara Israel a cometer". O texto bíblico nos diz porém que em recompensa por sua atuação contra o culto de Baal, os descendentes de Jeú reinariam a até a quarta geração.
Professor Eric H Cline, da George Washington University, observa que apesar de ter sofrido com Hazael e Salmaneser III, Jeú (e Israel) teriam cerca de cem anos de alívio (ou cerca de quatro gerações).:
Jeú, entretanto, acabou se tornando um perdedor em dose dupla, pois se tornou vassalo pagador de impostos para um Salmanasar que, de outro modo, teria sido dominado e que, provavelmente, não perdeu muito o sono quando Hazael decidiu cobrar sua vingança e atacar Jeú e destruir o reino vassalo de Israel da Assíria (fig. 3.9). Depois de Salmanassar, a ameaça assíria diminiui por quase um século, o que permitiu que o reino do norte se recuperasse, mas a tregua seria apenas temporária [11].
Além do contexto imediato, a inscrição é um elemento importante para avaliação do legado de Davi.
Conforme a avaliação do Professor Israel Finkelstein, da Universidade de Tel Aviv, a inscrição é relevante tanto no contexto histórico imediato:
Through fragmentary, this inscription offered a unique perspective on the turbulent politics of the region in the ninth century B.C.E. It describes from the aramean perspective , the territorial conflict between Israel and Damascus in the ninth century B.C.E and records how an Aramean king (Hazael) launched a punishing offensive against his southern enemies (ca 840 B.C.E) in which, so he claimed - he killed the king of Israel and his ally, the king "House of David (or bytdwd). (Tradução) Ainda que fragmentária, a inscrição oferece uma perspectiva única sobre a política turbulenta da região no século IX AC. Descreve a partir da perspectiva araméia, o conflito territorial entre Israel e Damasco no nono século AC e registra como um rei arameu (Hazael) lançou uma ofensiva punitiva contra seus inimigos do sul (cerca 840 AC) na qual, ele alegou - ter matado o rei de Israel e seu aliado, o rei da "Casa de Davi (ou bytdwd)[11].Quanto como evidência do legado de Davi, como fundador de uma dinastia real.
This was the first time that the name "david" was found in any contemporary source outside Bible, in this case only about a century after his lifetime. Moreover, it most probably specified the names of the two later kings - Joram of Israel and Ahaziah of Judah - both of whom are mentioned in the biblical text. Most significantly, Hazael employed a common idiom of his time by naming a state (Judah) after the founding of its ruling (or dominant) dinasty, bytdwd - just as the Assyrian labeled the "Northern Kingdom as the "House of Omri" or bit omri. (tradução) Esta foi a primeira vez que o nome" david "foi encontrado em qualquer fonte contemporânea fora da Bíblia, neste caso, apenas cerca de um século após sua vida. Além disso, ele provavelmente especificou os nomes de dois reis mais recentes - Jorão de Israel e Acazias de Judá - ambos mencionados no texto bíblico. Muito significativamente, Hazael empregou uma expressão idiomática de seu tempo nomeando um estado (Judá) em função de sua dinastia governante (ou dominante), bytdwd - assim como os assírios chamaram o reino do norte como a" Casa de Omri" ou bit omri.[11]A prática usual daquele contexto, era nomear o reino pelo fundador da casa dominante. Ao chamarem o Reino de Judá como "Casa de Davi", Hazael entende que havia um Rei Davi que fundou aquele Reino. Não é uma informação direta sobre Davi e a natureza de seu reino, mas é forte evidência de seu legado, cercade 3 ou 4 gerações após sua morte. Das dezenas de reis que Hazael se vangloria de ter derrotado, ele devota espaço especial em sua inscrição aos reis de Israel e da Casa de Davi.
Maxi e Mini, a obra deutoronomista como fonte histórica.
A Morte do Rei Saul, Elie Marcuse, wikicommons |
Desta forma, apresentamos acima vários momentos em que a evidência arqueológica acompanha o relato biblico, coincidindo em pessoas, eventos e tempo. Existem, porém, situações em que não foram encontradas evidências externas de eventos bíblicos, ou esta é contraditória, como a peregrinação no deserto e a conquista de Jericó e Ai. Além disso, muitos sítios com abundante material arqueológico tem limitada possibilidade de escavação, por serem grandes centros urbanos (ex. Jerusalém), além de guerras (Síria) e o tráfico de material arqueológico, que impede que artefatos sejam localizados em sítios sujeitos a escavações controladas cientificamente.
Israel Finkelstein tem sido bastante crítico contumaz do uso da arqueologia para "provar" a Bíblia. No Brasil, seu livro "The Bible Unearthed", foi traduzido como "A Bíblia não tinha razão". Contudo, ele é igualmente crítico da rejeição da obra deuteronomista como fonte, entendendo que é sim uma fonte rica de material histórico.
Primeiro, ele compara os padrões de assentamento observados nas escavações arqueológicas com as vilas, cidades e distritos mencionadas no texto bíblico:
Archaelogicals excavations and surveys have confirmed that many of the Bible's geographical listings - for example, of the boundaries of the tribes and the districts of the kingdom - closely match settlement patterns and historical realities in the eight and seventh centuries B.C.E.(tradução) Escavações e levantamentos arqueológicos confirmaram que muitas das listas geográficas da Bíblia - por exemplo, dos limites das tribos e dos distritos do reino - correspondem de perto aos padrões de assentamentos e realidades históricas nos séculos VIII e VII B.C.E.[11]Em seguida, compara as fontes extrabíblicas, como as inscrições assírias, sírias, moabitas etc..., citando o trabalho de Baruch Halpern, da Universidade da Georgia:
Baruch Halpern showed that a relatively large number of extra-biblical historical records - mainly Assirian - verify ninth to seventh-century B.C.E events described in the Bible: the mention of Omri in Mesha Stele, those of Ahab and Jehu in the Shalmameser III inscriptions, Hezekiah in the inscriptions of Sennacherib, Manasseh in the records of Esarhaddon ans Ashurbanipal, and so on.(Tradução) Baruch Halpern mostrou que um número relativamente grande de registros históricos extra-bíblicos - principalmente Assirianos - verifica os eventos do nono ao sétimo século aC descritos na Bíblia: a menção de Omri em Mesha Stele, os de Acabe e Jeú nas inscrições de Shalmameser III, Ezequias nas inscrições de Senaqueribe, Manassés nos registros de Esarhadom e Assurbanipal, e assim por diante.[11]E, por fim, a evidência linguistica, em que Finkelstein cita o Professor Avi Hurwitz, da Universidade Hebraica de Jerusalém:
No less significant is the fact, as indicated by the linguist Avi Hurwitz, that much of the Deutoronomistic History is written in late-monarchic Hebrew, which is different of Hebrew of post-exilic times.(Tradução) Não menos significativo é o fato, como indicado pelo linguista Avi Hurwitz, de que grande parte da História Deutoronomista é escrita em hebraico tardio monárquico, que é diferente do hebraico dos tempos pós-exílicos[11]Pontos semelhantes são enfatizados pelo Professor James D'Avila, da Universidade de Saint Andrews, fazendo uma comparação heurística da obra deutoronomista em comparação com a obra do historiador antigo Herodoto, de um lado, e Geoffrey de Monmouth, que basicamente é um relato legendário do ciclo arturiano :
The evidence seems pretty clear to me that the Dtr is more like Herodotus' work than Geoffrey's. There is good reason to doubt much of the account of the United Monarchy under David and Solomon. Archaeological survey points toward a small population in Judah and against a state apparatus that could have supported the sort of empire described for David and Solomon. (The new excavation in Jerusalem may or may not change this perspective. It's too early to tell.) If there was a Temple built in the time of Solomon, it probably was a more modest building than what is described and which seems to have been the template for the later temples in Judah, Elephantine, and perhaps Samaria. (Tradução) A evidência parece bastante clara para mim que o Dtr é mais parecido com o trabalho de Heródoto do que o de Geoffrey. Há boas razões para duvidar muito do relato da monarquia unida sob Davi e Salomão. Levantamentos arqueológicos apontam para uma pequena população em Judá e contra um aparato estatal que poderia ter apoiado o tipo de império descrito por Davi e Salomão. (A nova escavação em Jerusalém pode ou não mudar essa perspectiva. É muito cedo para dizer.) Se houvesse um templo construído na época de Salomão, provavelmente seria um edifício mais modesto do que o descrito e que parece ter sido o modelo para os últimos templos em Judá, Elefantina e talvez Samaria.Apontando os vários sincronismos e confirmações com a evidência extrabíblica e arqueológica:
All this said, the writer of the Dtr did have some good information. Quite a number of the kings of Israel and Judah are mentioned in outside sources, and in the Dtr they always appear in the proper order, at the proper time, and in relation to the proper figures in the larger ancient Near Eastern world. A few of the episodes, such as the Egyptian King Shishak's invasion of Judea in the time of Rehoboam; the destruction of Samaria by the Assyrian King Sargon II; the Assyrian King Sennacherib's invasion of Judea in the time of Hezekiah; and the Babylonian King Nebuchadnezzar's conquest of Jerusalem, receive independent verification from extrabiblical inscriptions. And the writer knows a good many details that show that some of the sources used were pretty good. For example, the denominations of weights used for commerce which are mentioned casually in the Dtr do correspond closely to the (sometimes inscribed) weights actually excavated in Judah, only in the late Iron Age II. (Tradução) Tudo isso dito, o escritor do Dtr teve acesso a algumas boas informações. Um grande número de reis de Israel e Judá é mencionado em fontes externas, e no Dtr eles sempre aparecem na ordem apropriada, no tempo apropriado, e em relação às figuras apropriadas no mundo antigo do Oriente Médio. Alguns dos episódios, como a invasão da Judéia pelo rei egípcio Sisaque na época de Roboão; a destruição de Samaria pelo rei assírio Sargão II; a invasão da Judéia do rei assírio Senaqueribe na época de Ezequias; e a conquista de Jerusalém pelo rei babilônico Nabucodonosor recebe uma verificação independente das inscrições extra-bíblicas. E o escritor conhece muitos detalhes que mostram que algumas das fontes usadas foram muito boas. Por exemplo, as denominações de pesos usadas para o comércio que são mencionadas casualmente no Dtr correspondem de perto aos pesos (por vezes inscritos) realmente escavados em Judá, apenas no final da Idade do Ferro.
Continua
Referências Bibliográficas:
[1] Airton José da Silva: "Os Minimalistas: Pode uma história de Israel ser escrita" https://airtonjo.com/site1/minimalistas.htm, acessado em 24/11/2018.
[2] Mario Liverani (2003) Para Além da Bíblia, História Antiga de Israel, fl. 137
[3] Amihai Mazar (1990) Arqueologia na Terra da Bíblia: 10000-586 AC, fls 383-385.
[4] Mario Liverani (2003) Para Além da Bíblia, História Antiga de Israel, fl. 139
[5] Kenneth Kitchen (2003) On the Reliability of the Old Testament, fls. 34-36
[6] Mario Liverani (2003) Para Além da Bíblia, História Antiga de Israel, fl. 175
[7] Kenneth Kitchen (2003) On the Reliability of the Old Testament, fl. 35
[8] Israel Finkelstein e Neil Sibermann (2002) The Bible Unearthed, fl 129
[9] Mario Liverani (2003) Para Além da Bíblia, História Antiga de Israel, fl. 151-152.
[10] Eric Cline e Mark W Graham (2011), Impérios Antigos: Da Mesopotâmia à Origem do Islã, fl. 107.
[11] Israel Finkelstein, Digging for the truth: Archaelogy and the Bible, In Schimdt (2007) The Quest for the Historical Israel, fl. 14
[12] James D'Avila (2005) "Evidence for the first ("Solomonic") Temple", post de 12/08/2005, http://paleojudaica.blogspot.com/2005_08_07_archive.html, acessado em 24/11/2018.
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