Afrodite, Lúcifer e Jesus

Um ditado bem interessante que tomou um fôlego enorme com o advento da internet é o de que "papel aceita qualquer coisa". Por mais fantástico que seja o potencial informativo da rede, a mesma é também palco de um festival enorme de bobagens e distorções. No meio religioso, então, as tolices se propagam na velocidade da luz. Uma destas besteiras é a que associa lúcifer a uma concha.

Neste site chamado Espada, podemos encontrar a brilhante equação:

"Concha = Afrodite = Vênus = Lúcifer"

Costuma-se dizer que Afrodite é representada por uma concha. De fato, apesar de associada a uma concha em alguns casos, esta divindade não é representada como uma concha em si. Ela é representada como saindo de uma concha, de onde nasceu, notadamente no famoso quadro de Boticelli. Variadas outras representações de Afrodite não a mostram associada à concha, como pode ser visto aqui ou nesta outra representação. De qualquer forma, Afrodite não é uma concha (essa concha está associada ao seu nascimento). Ela é uma divindade representada por uma mulher de extrema beleza.

Afrodite faz parte do panteão grego de divindades. No entanto, não existe apenas uma afrodite. Platão inclusive identificava duas Afrodites. A primeira seria a filha de Urano, chamada Urânia. Já a outra seria a filha de Dione. Qual destas duas Afrodites estaria, pois associada a Lúcifer?! (A de Urano, a de Dione, as duas?!)

Vênus era uma antiga divindade italiana. A palavra latina Venia está ligada à “graça”, à benevolência divina, o qual os antigos romanos esperavam notadamente de Vênus [daí o seu nome]. Afrodite foi associada à antiga Vênus romana em um momento posterior ao culto original. Dessa forma, existiram duas ou mais divindades diferentes em locais diferentes às quais foram associadas em um momento posterior [fato comum na antiguidade – a babilônia Ishtar, por exemplo também se referia ao planeta Vênus]

O planeta Vênus era chamado pelos antigos gregos de Phosphorus e/ou Hesperos. Os mesmos acreditavam serem duas estrelas diferentes – uma matutina, a outra vespertina. No período helenístico, hesperos foi traduzido para o latim como Vesper e phosphorus foi traduzido como Lucifer. Posteriormente os romanos iriam homenagear sua antiga deusa Vênus, dando-lhe este nome ao nome da estrela. Afinal, por que não colocar vésper, hésperos e phosphorus na equação que liga Vênus a Lúcifer?


Lúcifer nunca foi nome de ninguém. Lúcifer quer dizer apenas “o que leva a luz” ou “o portador de luz”, como foi exposto. Na bíblia este termo nunca se referiu a diabo algum. A errônea analogia se fez em função da passagem citada em Isaías 14,12 referente a um oráculo sobre o rei da Babilônia. Por outro lado, inversamente em Apocalipse é Jesus quem se denomina como Lúcifer:

Ap 22,16: “Eu Jesus, enviei meu anjo para vos atestar essas coisas a respeito das Igrejas. Eu sou o rebento da estirpe de Davi, a brilhante estrela da manhã.

Da mesma forma em II Pedro 1,19, em referência à Jesus:

“Temos, também, por mais firme a palavra dos profetas, à qual fazeis bem em recorrer como a uma luz que brilha em lugar escuro, até que raia o dia e surja a estrela d’alva em nossos corações."

Partindo destes pontos, podemos ver como uma série de ilações pode conduzir ao absurdo. Se tomarmos a inicial equação que associa Vênus a Lúcifer teríamos:

CONCHA = AFRODITE = VENUS = LUCIFER

Expandindo a brilhante equação:

CONCHA = AFRODITE = VENUS = LUCIFER = JESUS

Desta forma, acabamos descobrindo até que ponto os falsos silogismos e as falsas ilações podem alcançar. Ou seja: ao absurdo do completo nonsense.

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