quinta-feira, 23 de setembro de 2010

Os Critérios do Constrangimento e da Diferença e seus análogos fora da Pesquisa Histórica do Novo Testamento: Parte 3

Nos posts anteriores, analisamos as bases historiográficas dos critérios da diferença com a igreja primitiva (CDC) e do constrangimento (ou embaraçamento) utilizados na pesquisa do Jesus Histórico, e a aplicação de princípio analogo pelos historiadores na análise das narrativas da República Romana no século V AC e de de duas importantes figuras contemporâneas ao grande saque de Roma pelos gauleses e 390 AC, Marcus Manlius Capitulinos e Marcus Furius Camillus . Neste post, vamos abordar outro exemplo: o filósofo neo-pitagórico Apolonio de Tiana.

Exemplo 3: Critério do Constrangimento na avaliação das fontes sobre Apolonio de Tiana

Apolonio de Tiana (4-96 DC) foi um filósofo neo-pitagórico, com reputação de milagreiro, proveniente da cidade de Tiana, na Capadócia (atual Turquia) de grande fama e influência no mundo romano a partir do século III. No início do século IV, o proconsul romano Sossianus Hierocles, que governou o Egito e, posteriormente, a Bitínia, escreveu um livro chamado "O Amante da Verdade", uma crítica ao cristianismo, em que comparava Apolonio de Tiana a Jesus Cristo (de forma desfávorável ao último). O livro se perdeu, mas a maior parte de seu conteúdo chegou até nós por citações de Eusébio de Cesaréia (263-339 DC), em sua refutação, chamada "Contra Hierocles"

No entanto, quase tudo que sabemos sobre o filósofo de Tiana é proveniente de uma biografia chamada a "Vida de Apolonio de Tiana", em oito "livros" (totalizando cerca de 260 paginas), escrita por Lúcio Flavio Filostrato (172 -245 DC), por volta de 217-230 DC, a pedido da Imperatriz Julia Dona, esposa do Imperador Sétimo Severo (193-211 DC), e mãe dos Imperadores Geta (211 DC) e Caracala (211-217 DC). Ao comissionar o trabalho, a Imperatriz teria entregue a Filostrato um livro de memórias de um discípulo de Apolonio, chamado Damis, que seria proveniente da cidade de "Ninos", que estava em poder de um dos parentes de Damis . Além disso, Filostrato afirma ter buscado as tradições locais correntes nas cidades de Antioquia, Tiana, Aegea, e Efeso relativas ao filosofo; consultado os livros e cartas escritas por Apolônio; bem como os livros a respeito dele que teriam sido escritos por Maximo de Aegea e Moiragenes.

Mas podemos confiar em Filostrato? A resposta, para grande maioria dos historiadores, é um sonoro não.

Revisando a literatura acadêmica, encontramos afirmações como a de que Vida de Apolônio (que chamaremos de "VA") , em virtude da "falta de conhecimento filosófico e excessiva preocupação retórica" de Filostrato é um texto "muito pouco confíavel" em relação a Apolônio [1], "tal a quantidade de invencionices, ficção e falsidade histórica contida nesse livro" [2], e que em virtude disso, e pelo fato de ser praticamente nossa única fonte "o estado de provas é tal, que não se pode ter nenhuma certeza sobre o Apolônio original e apenas argumentos de probabilidade podem ser usados" [3].

O fato de ter sido escrito entre 120 a 150 anos após a morte de Apolônio não é um obstaculo intransponível para Vida de Apolônio, se as fontes fossem confíaveis. No entanto, a principal fonte, o Díario de Damis, supostamente uma testemunha ocular dos eventos, apresenta autencidade sobre severa suspeita. Uma das principais estudiosas de Apolônio, Professora Maria Dzielska, da Universidade Jagielloniana de Cracóvia (Polonia), observa em seu livro "Apolonius of Tyana in legend and History"

"The Hypomnèmata of Damis have always been a great problem in the studies of Philostratus' work. Scholars have wondered whether the memoirs were only a figment of Philostratus' literary imagination, or whether they constituted a real notebook compiled by a certain pupil of Apollonius. This question has been raised not only by specialists in literature but also by historians. The latest views on the "Damis question" I present below. On their basis I consider Damis a fictitious figure and his memoirs (or notebooks) an invention of Philostratus" [post script: texto em inglês adicionado 18.07.2011]
(tradução) A Hypomnèmata de Damis sempre foram um grande problema nos estudos sobre Filostrato. E os estudiosos tem se perguntado se são apenas produto da imaginação de Filostrato, ou realmente se trata de um livro de memórias compiladas por um díscipulo de Apolônio. Esta questão tem sido levantada não só por especialistas em literatura mas também por historiadores. O estado da arte sobre o "problema de Damis", eu apresento abaixo. Com base nesses estudos eu considero "Damis é um personagem fictício e suas memórias uma invenção de Filostrato" [4].

Dzielska observa também que "[o Diário de Damis, é ] uma ficção literária, porém planejada ao que parece com total consciência" "junto com Julia Dona (...) ele (Filostrato) criou Damis, o sírio de Ninive, a quem atribui, como a um muito fiel aluno, a autoria da história de vida do mestre Apolonio, que ele próprio havia criado"[5].

Professor John Ferguson, Open University, acompanha essa opinião, observando que o aparecimento de livros ou diários perdidos era um artifício comum de romances históricos:

"Philostratus professed to have discovered an old document by one Damis as his source, but such discoveries are the stock-in-trade of historical romances, and we can place no credence upon Damis [post script: citação em inglês adicionada em 18.07.2011]
(Tradução) Filostrato alegava ter descoberto um velho documento de um certo Damis como fonte, mas tais descobertas são os apetrechos de romances históricos, não podemos ter fé em Damis"[6]

Acima foi apresentada a posição dominante. Uma posição alternativa, embora minoritária, é apresentada pelo Professor de História Antiga da Universidade Livre de Amsterdã, Jaap-Jan Flinterman que acredita que:

Probably the most controversial part of my findings was (and still is) the conclusion that 'Damis' - the disciple of Apollonius whose memoirs Philostratus claims to have had access to - was not a Philostratean invention, but a second- or early third-century pseudepigraphon. This position is in contradiction with an almost complete scholarly consensus that 'Damis' is a literary fiction, a view powerfully argued by Ewen Bowie [in Aufstieg und Niedergang der Römischen Welt II 16.2 (Berlin/New York 1978), 1652-1699]. [7] (post script: texto em inglês adicionado em 18.07.2011)
(Tradução)"Provavelmente a conclusão mais controversa do meu trabalho foi (e ainda é) que Damis, o discípulo de Apolônio as quais as memórias Filostrato afirma ter tido acesso, não foi uma invenção de Filostrato, mas um livro pseudoepigráfico escrito no segundo, ou início do III século DC". Esta posição vai contra a quase total consenso dos estudiosos de que "Damis" é uma ficção literária, um ponto de vista defendido vigorosamente por Ewen Bowie [in Aufstieg und Niedergang der Römischen Welt II 16.2 (Berlin/New York 1978), 1652-1699] [7].

Embora concorde que os argumentos utilizados para demonstrar que memórias não foram escritas por Damis ou uma testemunha ocular são fortes, Flinterman acredita que a possibilidade de que foram escritas por outra pessoa e atribuidas a Damis é bem mais difícilo de refutar [7]. Ou seja, o que podemos dizer é que o consenso acadêmico é de que ou Filostrato inventou as memórias de Damis, ou, na melhor das hipóteses ele utilizou uma obra, pseudoepigráfica, de um falsificador anterior. Tal qual os evangelhos de "Tomé", ou "Pedro", ou "Atos de João".

Para sustentar sua posição, Flinterman utiliza dois argumentos, um deles baseado em um raciocínio análogo do critério do constrangimento:

"Meyer's contention that Philostratus' invented Damis to substantiate his own view of Apollonius founders on the fact that the author refers to 'Damis" for information he feels uncomfortable about. Meyer's argument can be inverted: if the author's attitude towards magics can be characterized as a combination of contempt and aversion, it is hardly conceivable that he would have ascribed to an invented source information which causes such uneasiness as to compel him to dissociate himself from his own invention (VA III, 41; VII 39). [7]
[Tradução] A tese de Meyer de que Filóstrato inventou Damis para justificar o seu próprio ponto de vista sobre Apolônio se baseia no fato de que o autor se refere a "Damis" para informações que ele sente pouco à vontade. O argumento de Meyer pode ser invertido: se a atitude do autor em relação a magia pode ser caracterizado como um combinação de desprezo e aversão, é dificilmente concebível que ele teria atribuído a uma fonte inventada informações que o constragem de tal forma a obrigá-lo a se dissasociar de sua própria invenção (VA III, 41; VII 39) [7]

Ou seja, uma dos temas fortes em Filostrato é a tentativa de mostrar que Apolonio de Tiana não era um mágico, mas um grande filósofo e um campeão da cultura grega. O fato de Damis, a principal fonte de Filostrato, que ele afirmava ter sido uma testemunha ocular da vida de Apolônio, indicar as vezes que Apolônio utilizava magia, evidencia de que a fonte não foi completamente inventada por ele.

Jona Lendering, que também lecionou história antiga (e metodologia histórica) na Universidade Livre de Amsterdã, concorda com Flinterman, com raciocínio semelhante:

"There are very strong indications that the "Scraps from the manger" contained information that Philostratus found embarrassing. For example, Damis mentions that Apollonius wrote a book On astrology; as we have seen above, Philostratus was skeptical about its existence, because he did not like magic (LoA 3.41). (...) Philostratus repeats his argument that Apollonius was not a wizard or a magician, but performed his supernatural acts (...) because he had a superior wisdom and deeper insights in the nature of the universe. It is obvious that Philostratus felt uncomfortable with the Scraps from the manger, and this makes it likely that a source -whatever its precise nature- did really exist.. [8] (Grifo nosso)
(tradução) Há indícios muito fortes de que "Scraps from the manger" continha informações que Filóstrato considerou embaraçosas. Damis menciona que Apolônio escreveu um livro sobre astrologia, como vimos acima, Filóstrato era cético sobre a sua existência, porque ele não gostava de magia (LOA 3,41 ) (...) Filóstrato repete seu argumento de que Apolônio não era um feiticeiro ou um mago, mas realizou sua feitos sobrenaturais (...) porque tinha uma sabedoria superior e uma compreensão profunda da natureza do universo . É obvio que Filóstrato se sentiu desconfortável com "Scraps from the manger", sendo isso torna provável que a fonte - seja qual for a sua natureza precisa - realmente existiu. [8]

Os livros de Apolônio não sobreviveram ao nosso tempo, mas além do livro sobre Astrologia, mencionado acima, ele teria escrito um livro sobre as doutrinas de Pitagoras, um Hino de Louvor a Memória, e um livro sobre Sacríficios. Professor Lendering observa que pelo menos este último livro provavelmente existiu. Ele chega a essa conclusão baseado em uma linha de raciocínio semelhante a do critério da diferença ou dissimilaridade:

"The treatise On sacrifices certainly existed. Philostratus claims to have seen it 'in several cities and in the houses of several learned men' and claims that 'if anyone should translate it, he would find it to be a grave and dignified composition' (LoA 3.41). Philostratus' confession that On sacrifices was written in Apollonius' native tongue (probably Aramaean, see note 5) is at odds with his portrait of Apollonius as a champion of the Greek culture, and this suggests that the book did really exist." [9]
(tradução) "O tratado sobre Sacrifícios certamente existiu. Filóstrato afirma ter visto isso em várias cidades e nas casas de vários homens instruidos e afirma que se alguém o traduzisse, encontraria um livro profundo e dignificante (LOA 3,41). A confissão de Filóstrato de que "dos sacrifícios" foi escrito na lingua nativa de Apolônio (provavelmente Arameu, ver nota 5) está em desacordo com o seu retrato de Apolônio como um defensor da cultura grega, e isto sugere que o livro realmente existiu" [9]

Ou seja, o fato de Filostrato mencionar um livro de Apolonio que não foi escrito em grego (mas em uma lingua "barbara"), não atende ao interesses de biógrafo de apresentar Apolonio com um campeão da cultura grega, implicando que ele provavelmente não inventou essa informação. Lendering observa também que a existência do livro é reforçada pelo fato de tanto Porfírio, quanto Eusébio de Cesaréia (que escreveram cerca de 200 anos após a morte de Apolônio), citam um paragrafo de "Dos Sacrifícios" (Da abstinência 2:34; Praeparatio Evangelica, 4:13), que é, por sinal, a única citação de Apolônio que pode ser considerada autêntica com alguma segurança [9]

Filostrato transcreve várias cartas de Apolônio em sua biografia, e uma coleção de cerca de 100 delas chegaram até nós. No entanto, a autenticidade delas esta sujeita a sérias dúvidas. De modo geral, os estudiosos tem constatado que boa parte delas são "obviamente inspiradas por Vida de Apolônio"[10], outras refletem polêmicas anti-cristãs [10], dos séculos IV e V [11], e algumas outras cartas podem ter sido "herdadas por ele [Filostratõ], de algum falsificador anterior" [11]. Como nItálicoão existem outros escritos de Apolônio, "de autenticidade confirmada, para fazermos a comparação estilística com as cartas. Sobre a maioria destas, devemos nos contentar em expor probabilidades e apresentar linhas especulativas de argumentção" [11]. Em todo caso, as cartas são "apócrifas, em sua maioria" [12], . Contudo, observa Lendering, excluidas as cartas inspiradas por Filostrato e as fabricações anti-cristãs posteriores, o restante da coleção apresenta elementos que são mais antigos que a biografia de Filostrato, e mesmo que esse núcleo mais antigo não tenha sido realmente escritas por Apôlonio (é provavel que tenham sido elaboaradas pseudoepigraficamente por volta de 140 DC, em Atenas), o simples fato de alguém as ter fabricado sugere fortemente que já em meados do século II Apolonio era considerado uma figura importante, ou seja, mesmo que sejam falsificações as cartas estam associadas a tradições muito mais antigas, que provavelmente refletem alguma informação autêntica sobre Apolônio [13]. Utilizando um raciocínio análogo ao critério do constrangimento, Lendering observa:

"Reading the letters said to be sent to the Roman philosopher C. Musonius Rufus (c.30-c.100), we get the impression that Musonius is the winner of the polemic [note 4]; this is, of course, too embarrassing to be invented by an admirer of the Tyanean. It must antedate the composition of the collection in the 140's, and may even reflect a real polemic. [10]" (tradução) Lendo as cartas que teriam sido enviadas para o filósofo romano C. Musonius Rufus (c.30-C.100), ficamos com a impressão de que Musonius é o vencedor da polêmica [nota 4], isto é, naturalmente, muito constrangedor para ter sido inventado por um admirador do Tianeu, e deve preceder a composição da coleção dos anos 140, e pode até refletir uma polêmica real. [13]

Lendering cita também duas outras cartas em que a questão da magia é abordada por Apolonio positivamente, e que, portanto, seriam constragedoras para Filostrato, não tendo sido, portanto, provavelmente inventadas por ele:

"In two letter to Euphrates,#16 e # 17, we encounter an Apollonius who would have scared Philostratus to death: the author of these letters proudly confesses he is a magician, and goes on to give a positive interpretation of that word. These letters were centainly not invented by Philostratus" [13]
(tradução) Em duas das cartas ao Eufrates, # 16 e # 17, encontramos uma Apolônio que teria deixado Filóstrato apavorado: o autor destas cartas orgulhosamente confessa que ele é um mágico, e até apresenta uma interpretação positiva da palavra. Estas cartas certamente não foram inventadas por Filóstrato" [13].

No que se refere a atestação externa de Apolônio de Tiana, no período pré-Filostrato, existe uma unica breve menção, na obra de Luciano de Samosata (120-190 DC), chamada Alexandre, o falso profeta, escrita por volta de 85 anos após a morte de Apolônio, em cerca de 180 DC, baseada na vida do criador do culto ao deus Glicon, Alexandre de Abonoteichus (105 - 170 DC), que Luciano considerava um charlatão, e que na sua juventude teria sido discípulo de um mágico, seguidor da escola de Apolônio de Tiana (Alexandre, 5:31). O contemporâneo de Filostrato, Cassio Dio (160-230 DC), escrevendo por volta do ano 229 DC, menciona Apolônio, brevemente, duas vezes, ao descrever o assassinato do Imperador Domiciano (96 DC), ele, de uma forma um tanto zombeteira, diz que Apolônio de Tiana, fazendo um discurso em Éfeso, teve uma premonição no exato momento em que o Imperador era morto (Historia Romana, 67.18.1), episódio que Filostrato também narra (VA 8:26, baseado em uma tradição corrente em Éfeso). Dio também nos diz que o Imperador Caracala (211-217 DC) - filho de Julia Dona, "patrocinadora" de Filostrato - tinha atração por magia e coisas semelhantes, e por isso construiu um santuário para o grande mágico Apolônio em Tiana (Historia Romana 78.18.4).

Por fim, devemos citar dois tratados sobre Apolônio citados por Filostrato, mas que não sobreviveram. O primeiro é uma obra que teria sido escrita por um certo Máximo de Aegea, sobre a infância e a juventude de Apolônio naquela cidade, onde Apolonio servia no templo do deus Asclepio. De modo geral, o trabalho de Máximo contribuiria pouco para o estudo do Apolônio histórico, e "podemos comparar o livro de Máximo de Aegea com o Proto-Evangelho de Tiago: uma criação cristã do segundo século, que tinha o objetivo de complementar os evangelhos, contando da infância de Jesus. Os díscipulos de Apolonio podem ter sentido uma necessidade similar de informação sobre os primeiros dias de seu herói"[14]. De Moiragenes, e o que ele teria escrito, quase nada se sabe, Filostrato afirma que seu livro sobre Apolonio era muito pouco confíavel, e não era digno de atenção, pois ele não conhecia suficientemente Apolonio (VA 1.3). Orígenes, afirma que Moiragenes relata o debate entre Eufrates de Tiro, Apolônio e um filosofo epicureu, e retrata Apolonio como mágico e filósofo (Contra Celso 6:41). Professora Maria Dzielska, seguindo Ewen Bowie, data a obra de Moiragenes no meio do século II, anos após discipulos e admiradores de Apolonio terem supostamente fabricado as cartas entre ele e Eufrates de Tiro, (ainda quea possibilidade de Eufrates e Apolônio terem realmente se envolvido em polêmica não possa ser excluida). [15]. Moiragenes poderia ser uma fonte importante, caso sua obra tivesse sobrevivido, ou nós não tivessemos dele apenas um referência e um fragmento.

Após analisar e situar o caráter geral das fontes sobre Apololonio, o Prof. Lendering passa a avalia-las quanto as informações factuais que podem ser extraidas sobre o filosofo de Tiana. Para isso, utiliza não só o critério do constrangimento, mas também uma metologia muito similar a usada nos estudos do Jesus Histórico:

Having discussed what little we know about the pre-Philostratean traditions, we can try to add things up, using four criteria of authenticity.
Independent confirmation: when an author who is not primarily interested in Apollonius confirms something in a source on Apollonius, we may assume that we are approaching the historical truth.
Multiple attestation: when independent, pre-Philostratean traditions about Apollonius are in agreement, we may be reasonably certain that they contain some historical truth. The problem with this method is, of course, that it is not always easy to establish independence.
Embarrassment: embarrassing information about the man from
Tyana also has a claim to historical reliability.
Consistency: sometimes the truth of statement can be confirmed after other facts have been established [14].

(tradução) Tendo discutido o que pouco se sabe sobre as tradições pré-Filostrateanas, podemos tentar analisar o que temos , usando quatro critérios de autenticidade.
Confirmação Independente: quando um autor que não está interessado primeiramente em Apolônio confirma algo em uma fonte de Apolônio, nós podemos assumir que estamos nos aproximando da verdade histórica.
Múltipla Atestação: quando tradições pré-Filostrateana sobre Apolônio estão de acordo, podemos estar razoavelmente certos de que eles contêm alguma verdade histórica. O problema com este método é, naturalmente, que nem sempre é fácil estabelecer independência.
Constrangimento: informações embaraçosas sobre o homem de Tiana também podem reivindicar confiabilidade histórica.
Consistência: às vezes a verdade da afirmação pode ser confirmada após outros fatos já estabelecidos.

Com base nesses critérios, Lendering conclui que alguns elementos da tradição são quase certamente factuais, dentre os quais:

Apollonius was considered a magician. Independent confirmation: it is taken for granted by Cassius Dio, Lucian (the latter referring to a disciple) and Anastasius Sinaitica [note 8]. Fourfold attestation: to be found in the Reminiscences of Moeragenes, in the memoirs of Damis, in the Letters of Apollonius, and in the Antiochene tradition. Embarrassment: Philostratus clearly felt uncomfortable with this, and three times offers apologies. [16]
(tradução) Apolônio era considerado um mago. Confirmação independente: é aceito por Cassio Dio, Luciano (este último referindo-se a um discípulo) e Anastácio Sinaitica nota [8]. Atestação quadupla: é encontrada nas reminiscências de Moeragenes, nas memórias de Damis, nas Cartas de Apolônio, e na tradição de Antioquia. Constrangimento: Filóstrato claramente sentiu desconfortável com isso, e três vezes oferece desculpas. [16]

O fato de Luciano e Cassio Dio tenham escrito cerca de 80 a 130 anos após a morte de Apôlonio - e suas menções sejam breves, e possam refletir apenas o conhecimento comum sobre o filósofo em suas respectivas épocas - teria valor histórico limitado como testemunho independente (assim como Anastasius Sinaita, que morreu por volta do ano 700) . No entanto, ambos confirmam independentemente Apolônio como mágico, imagem também multiplamente atestada em elementos das tradições pré-filostratianas, no pseudo "Damis", na tradição local de Antioquia no século III, e em algumas cartas atribuidas a Apolônio - identificadas com base na sua resistência a tendência redacional em Filostrato, que queria apresentar Apolônio como sábio, homem divino e campeão da cultura grega, e tentou de todas as formas apagar a percepção constrangedora de Apolônio como mágico - bem como em Moiragenes. Isoladamente, as referências tardias a Apolônio e a natureza problematica das tradições pre-filostratianas tem pouca relevância do ponto de vista histórico, contudo, tomadas em conjunto com os elementos constrangedores, nos dão confiança de que esses mesmos elementos são provavelmente factuais.

Um situação semelhante nos estudos do Jesus Histórico é o fato da crucificação de Jesus. Como exercício, colocando de lado por um momento o fato aceito pela grande maioria dos estudiosos de que Josefo provavelmente se referiu a Jesus (o que nos fornece, por si só, confirmação mais do que suficiente de que ele foi crucificado por Pilatos), o fato de termos confirmação independente em Tácito e Luciano de Samosata, 80 e 140 anos após a morte de Jesus, se referirem a sua crucificação (intervalo similar ao de Apolônio), que Paulo, Marcos, João e, possivelmente, Q atestarem multiplamente esse fato, combinado com o constrangimento, pelo fato de que a crucificação era uma forma de morrer vergonhosa, um escândalo para os judeus, e vergonha para os gregos (I Corintios 1:23). Isoladamente, Luciano e Tácito contam pouco, e alguns tem adotado uma postura fortemente cética quanto as tradições evangélicas, mas, quando tomamos em conjunto com elemento constrangedor da execução vergonhosa, é muito díficil negar a factualidade da crucificação.

Apollonius wrote a book On astrology. Twofold attestation: On astrology is mentioned by Moeragenes and Damis. Embarrassment: Philostratus expresses his disbelief about the existence of On astrology [16].
(tradução) Apolônio escreveu um livro sobre astrologia. Atestação dupla: "Da Astrologia" é mencionado por Moeragenes e Damis. Constrangimento: Filóstrato manifesta sua descrença sobre a existência desse livro [16]

Aqui também a combinação de um elemento que é multiplamente atestado e a mesmo tempo criava problemas para Filostrato indica fortemente que Apolonio realmente escreveu um livro sobre Astrolgia. Um pararelo aproximado nos estudos do cristianismo primitivo, são os ditos multiplamente atestado em que Jesus prega a vinda iminente do Reino de Deus (ex. Marcos 1:15, 14:25, Lc 11:2, Mt 8:11, Lc 6:17-20), e o problema causado já na segunda e terceira gerações de cristão que não viram a manifestação vísivel desse Reino e questionavam "onde esta a promessa de sua vinda" (II Pedro 3:11), ou a explicação em João a irmãos que acreditavam que o discipulo amado não morreria até a vinda de Jesus (João 21:23).

CONTINUA
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Referências Bibliograficas
[1] Jona Lendering, Apollonius of Tyana, Parte 1: "Philostratus' Life of Apollonius", disponível em http://www.livius.org/ap-ark/apollonius/apollonius01.html#Life, acessado 20.09.2010
[2] Maria Dzielska (1986), Apollonius of Tyana in legend and history, fl. 185
[3] Ewen Lyall Bowie (1978), Apollonius of Tyana, Tradition and Reality, in ANRW, 2.16.2, fls. 1685-1686.
[4] Maria Dzielska (1986), Apollonius of Tyana in legend and history, fl. 19
[5] Maria Dzielska (1986), Apollonius of Tyana in legend and history, fl. 190-191
[6] John Ferguson (1970) Religions of Roman Empire, fl. 182
[7] Jan Jaap Flinterman, Sumário de Politiek, Paideia & Pythagorisme (1993), disponível em http://www.xs4all.nl/~flinterm/Power-Paideia-Pythagoreanism.html, acessado em 20.09.2010 [8] Jona Lendering, Apollonius of Tyana, Parte 6: "Damis of Niniveh" disponível online http://www.livius.org/ap-ark/apollonius/apollonius06.html#Damis, acessado em 20.09.2010
[9] Jona Lendering, Apollonius of Tyana, Parte 4: "Apollonius Books", disponivel online
www.livius.org/ap-ark/apollonius/apollonius04.html#Apollonius%27%20books, 20.09.2010
[10] Jona Lendering, Apollonius of Tyana, Parte 3: "Apollonius' Letters", disponivel online
www.livius.org/ap-ark/apollonius/apollonius03.html#Apollonius%27%20letters, 20.09.2010
[11] Robert J. Penella (1979) The letters of Apollonius of Tyana: a critical text with prolegomena, translation and commentary, fls 24-25 e 28.
[12] Maria Dzielska (1986), Apollonius of Tyana in legend and history, fl. 190
[13] Jona Lendering, Apollonius of Tyana, Parte 3: "Apollonius' Letters", disponivel online www.livius.org/ap-ark/apollonius/apollonius03.html#Apollonius%27%20letters, 20.09.2010
[14] Jona Lendering, Apollonius of Tyana, Parte 5: "Other Sources", disponivel online http://www.livius.org/ap-ark/apollonius/apollonius05.html, 20.09.2010
[15] Maria Dzielska (1986), Apollonius of Tyana in legend and history, fl. 45-46
[16] Jona Lendering, Apollonius of Tyana, Parte 7: "Evaluation of the sources", disponivel online http://www.livius.org/ap-ark/apollonius/apollonius05.html, 20.09.2010

1 comentários:

Nehemias disse...

Caro Sandro,

Obrigado pela visita, e pelas palavras.

Abs,

Nehemias

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